segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A aparência do amor


"Pode-se prometer atos, mas não sentimentos; pois estes são involuntários.

Quem promete a alguém amá-lo sempre, ou sempre odiá-lo ou ser-lhe sempre fiel, promete algo que não está em seu poder; mas ele pode prometer atos que normalmente são consequência do amor, do ódio, da fidelidade, mas também podem nascer de outros motivos: pois caminhos e motivos diversos conduzem a um ato.

A promessa de sempre amar alguém significa, portanto: enquanto eu te amar, demonstrarei com atos o meu amor; se eu não mais te amar, continuarei praticando esses mesmos atos, ainda que por outros motivos: de modo que na cabeça de nossos semelhantes permanece a ilusão de que o amor é imutável e sempre o mesmo.

Portanto, prometemos a continuidade da aparência do amor quando, se cegar a nós mesmos, juramos a alguém amor eterno."
[Friedrich Nietzsche]

Ah, quantos corações seriam poupados se tivéssemos consciência disso... Se assim for, que a promessa seja consciente, que os atos sejam verdadeiros e as palavras, suaves.

domingo, 19 de setembro de 2010

Você conhece o Skoob?

Descobri o Skoob (books ao contrário) há alguns meses, com a promessa de ser uma rede social voltada totalmente para amantes da leitura. Fiquei surpresa com o fato de existir uma rede voltada para leitores (como assim eu não conhecia? rs), e mais surpresa ainda (confesso) ao saber que foi desenvolvido por brasileiros, muito legal!

Eu, é claro, corri para fazer meu cadastro no site.

É, realmente, uma rede social: é possível “fazer amigos”, deixar comentários na página de outra pessoa, participar de comunidades, etc.

Mas os criadores do site brilharam mesmo por possibilitar aos usuários terem sua “estante virtual”, ou seja, você pode cadastrar livros que leu/quer ler e muito mais do que isso: é possível classificá-los de inúmeras maneiras. Isso mesmo: lidos, não lidos, abandonados, desejados, estou lendo, meta de leitura, emprestado, tenho ou não, além das formas convencionais (como o gênero, autor, nota).

Além disso, é possível fazer críticas sobre as obras, bem como registrar sua evolução de leitura no seu perfil. Se você quiser trocar algum livro, consegue descobrir quem deseja aquele livro e quem também tem interesse em troca.

Eu, que há séculos buscava um catalogador de livros, achei essa ferramenta fantástica, sobretudo por ser virtual. Digo isso porque comecei a catalogar todos os meus livros no Libra, um programa bem legal (só que com muito menos possibilidades de classificação/detalhamento que o skoob), mas na troca de PC perdi todo o meu longo trabalho.

Para mim o skoob é perfeito enquanto “estante virtual”, mas deixa a desejar quanto ao seu objetivo de ser uma rede social de leitores. Isso porque não é nada fácil (aliás, é bem difícil) localizar conhecidos no site. Senti falta de um sistema de busca mais abrangente, ou ainda que fizesse uma “conexão” com seus contatos do e-mail, algo assim.

Bem, fica a dica para aqueles que, como eu, amam ler e sempre quiseram um lugar para cadastrar os livros e trocar impressões.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

"Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você...


Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada aos poucos e com mais força enquanto a noite avança. Não são pensamentos escuros, embora noturnos. Tão transparentes que até parecem de vidro, vidro tão fino que, quando penso mais forte, parece que vai ficar assim clack! e quebrar em cacos, o pensamento que penso de você. Se não dormisse cedo nem estivesse quase sempre cansado, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam clack! de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis. Brilham, na palma da minha mão. Num deles, tem uma borboleta de asa rasgada. Noutro, um barco confundido com a linha do horizonte, onde também tem uma ilha. Não, não: acho que a ilha mora num caquinho só dela. Noutro, um punhal de jade. Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas que são bonitas. Parecem filme, livro, quadro. Não doem porque não ameaçam. Nada que eu penso de você ameaça. Durmo cedo, nunca quebra."
(Caio Fernando Abreu)

terça-feira, 7 de setembro de 2010

El mismo amor, la misma lluvia

Depois dos últimos posts sobre filme terem privilegiado o cinema francês, resolvi dar uma volta no cinema argentino, que muito tem me surpreendido também.

Pensando nisso, estava decidida a escrever sobre o filme “O segredo de seus olhos”, dirigido por Juan José Campanella e ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2010.

Pesquisando mais sobre o diretor, li sobre outra obra dele, “El mismo amor, La misma lluvia” (de 1999), ou “O mesmo amor, a mesma chuva”, curiosamente protagonizado pelos mesmos atores (Ricardo Darín e Soledad Villamil) que “O segredo de seus olhos”.

Assim como um livro me ganha (à primeira vista) pela capa, um filme me ganha pelo título (ou pelas falas), e esse com certeza foi um dos casos.

Assisti a este filme hoje e, como eu esperava, não me decepcionei. Sabe-se lá o porquê, ele não foi parar nas nossas salas de cinema, foi direto para as locadoras.

Jorge (Ricardo Darín) escreve crônicas românticas para uma revista argentina. O trabalho é medíocre e não lhe permite mostrar ao público seu talento. Assim segue sua vida, em meio à conturbada década de 80 na Argentina.

Em um dia de chuva ele avista uma moça que se encanta com as gotas de chuva caindo sobre seu rosto. A moça é Laura (Soledad Villamil), garçonete, atriz e estudante de artes plásticas. Não só isso, é também a moça com quem ele se reencontra num desses muitos acasos do destino e que será, se assim posso dizer, a mulher que ele ama.

O romance dos dois resiste à Guerra das Malvinas, ao fim da ditadura e ao início do novo governo, mas não resiste a eles mesmos, ao tempo, ao desgaste da convivência. O rompimento, aqui, não significa o fim do filme, nem o ápice do enredo. Jorge e Laura não morrem de amor, nem abandonam a vontade de viver. Eles simplesmente vivem com suas dores, seus fracassos e desilusões, como a grande maioria de nós faz todos os dias.

Ao longo de quase duas décadas acompanhamos a vida desses personagens, sobretudo a de Jorge, e somos apresentados aos caminhos que escolheram seguir desde que se separaram.

Apesar de tudo, fica um ar de esperança, de amizade, de amor e a convicção de que um novo começo sempre é possível, ainda que demore, ainda que seja difícil.

O filme é precioso porque nos dá a sensação de que Laura e Jorge poderiam facilmente ser quaisquer pessoas, poderiam ser eu ou você. Como assim? A história é o cotidiano, é uma rotina. Não é como os filmes, comédias ou romances, que dão bilheteria: nos agradam e fazem rir, mas deixam aquela conhecida sensação de que na vida os amores são menos belos e menos fantasiosos que no cinema. Nesta obra o amor e a vida são o que são, sem grandes truques, sem grandes vilões, só nós mesmos.

Campanella nos mostra, da melhor forma o possível, que a arte muitas vezes imita a vida, e não há nenhum problema nisso.