quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Direitos desconhecidos são direitos que jamais serão exigidos


Outro dia, em uma palestra sobre os 20 anos da Constituição Mineira, a ministra Carmen Lúcia disse uma frase mais ou menos como essa aí de cima. Foi quando comecei a pensar sobre quantos dos nossos direitos nós desconhecemos, quantos deles nunca conheceremos e, o que talvez seja pior, quantos até conhecemos, mas não exigimos.

Aqui estão, então, alguns direitos que podem ser úteis no cotidiano:

* Multas de trânsito:

Se você receber uma multa por infração leve ou média (ex.: art. 181 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB), e não tiver sido multado pelo mesmo motivo nos últimos 12 meses, pode ir ao DETRAN (dentro do prazo para recorrer da multa) e requerer que a sua multa seja convertida em advertência por escrito (art. 267 do CTB). Você ainda vai perder os pontos na carteira, mas pelo menos não vai ter que pagar nada.

* Consumo:

- Quando comprar/contratar um produto/serviço fora do estabelecimento (ex: internet), você tem 7 dias, contados da data da assinatura do contrato ou do recebimento do produto, para arrepender-se e ter seu dinheiro de volta (art. 49 do CDC).

- Se você comprou o produto na loja X, é ela que tem que enviá-lo para a assistência técnica, por ex., e não você. O fornecedor não pode dificultar as coisas para o consumidor.

Para saber mais direitos de consumidor, clique aqui.

* Nas casas noturnas...

- A cobrança de uma “multa” (geralmente altíssima) em caso de perda da comanda é abusiva (art. 39, V, do CDC). Ademais, é dever do estabelecimento manter registro do que foi consumido por cada cliente.

- A “consumação mínima” também é considerada ilegal pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, pois condiciona a entrada do consumidor no recinto a, no mínimo, aquele valor. Vale conferir o art. 39, I, do CDC. Mais sobre isso, clique aqui.

* Aluguel de imóveis:

Quando o contrato de locação tiver prazo determinado (ex.: 18 meses), o locador não pode exigir o imóvel de volta antes do fim de tal prazo (isso, claro, se o locatário cumpre seus deveres). Ainda que exista uma cláusula no contrato que permita isso (como geralmente existe), ela é ilegal, pois fere o art. 4º da Lei 8.245/91.


Como já disse acima, às vezes não exigimos nossos direitos porque não os conhecemos, mas tantas outras vezes eles são conhecidos e, mesmo assim, nada fazemos a respeito, não os reinvidicamos por pensar que não vale a pena, ou por simples descrença, seja na honestidade das pessoas, seja no Judiciário do nosso País.

Há, ainda, outro motivo pelo qual costumamos nos calar, mesmo sabendo que estamos certos e que podemos cobrar que aquilo nos seja dado/ garantido/ feito: o medo (às vezes não é o medo,é a certeza mesmo) de que seremos ridicularizados, mal-falados, taxados de chatos, implicantes e tantos outros adjetivos pejorativos. Talvez esse seja o mais forte dos motivos, e, sinceramente, isso é horrível.

Um exemplo típico disso: todos sabemos que temos direito ao troco CERTO. Se o produto custa R$15,00 e você paga R$20,00, vai querer seus cinco reais de troco.

Então, se outro custa R$9,98 e você paga R$10,00, tudo bem se os dois centavos (dois míseros centavos, alguns devem estar pensando) ficarem para a loja? O mesmo direito que está presente naquele caso, está nesse. É claro que cinco reais são diferentes de um (ou dois) centavo(s), mas a questão não é essa, nem é sobre ser ou não "mão de vaca". A questão é que se o produto, na prateleira, custa R$9,98, porque no caixa ele passa a custar R$10,00? Se a loja não tem troco, que coloque o real preço dos produtos nas etiquetas, ou, no caixa, arredonde o valor para baixo, e não para cima (isso é enriquecimento sem causa!). A situação seria menos pior se, na hora de pagar, o atendente informasse ao cliente que estão sem troco, mas nem isso. Simplesmente fingem que nada devem e, se o cliente (depois de pensar duas vezes) reclama pelo troco, fazem cara feia e agem com má-vontade.

Parece que nós nos acostumamos tanto a não reclamar e reinvidicar que, não só não fazemos nada, como também criticamos duramente os que fazem.

No começo são coisas pequenas (por ex., os alunos não pedem ao professor que sempre falta que reponha suas aulas e o aluno que pede é chato), mas quando nos acostumamos a não ligar para pequenos desrespeitos, começamos, sem perceber, a nos acostumar com atos cada vez mais desrespeitosos. E isso vale não só para nossos direitos, vale para tudo.

Posso estar enganada, mas assim como não tenho visto quase ninguém confrontando uma decisão/atitude da qual discorda e que sabe não ser certa, também não tenho visto muitas pessoas cobrando do governo uma explicação sobre tantos escândalos, corrupções, mensalões... Ninguém cobrando dos políticos que ajam com decência e respeito ao povo que teoricamente representam.

Parece que ao longo do tempo aprendemos a deixar por aí, em cada esquina da vida, um pouquinho das garantias que a nossa tão falada cidadania nos oferece.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

De costas para o mundo, de Åsne Seierstad



O livro é como um mosaico composto por breves relatos sobre a vida de treze sérvios (jornalistas, artistas, refugiados, religiosos, jovens da oposição, partidários de Milosevic, etc.). Por meio de sua narrativa, Åsne nos revela um pouco sobre a população da região e nos faz ter uma visão mais interna do conflito que a assolara anos antes (a Guerra da Bósnia), bem como de suas consequências.


Cada uma dessas pessoas foi visitada pela autora em diversos momentos e em diferentes anos, o que possibilitou que uma evolução de seus pensamentos sobre o governo e sobre a vida em geral fosse traçada. Cabe dizer que, mais do que somente o aspecto político, a obra preocupa-se em mostrar como a vida pessoal de cada um era afetada (ou não) pelas mudanças e crises no governo.

Cada história inicia-se no período de crise do governo de Milosevic, os relatos trazem a confiança de seus seguidores, que acreditavam que seu governo se reerguereria, e a luta daqueles que integravam a oposição, esperançosos de que a “era” de Milosevic fosse finalmente chegar ao fim.

Como se sabe, Milosevic foi derrubado do poder em outubro de 2000, com grande participação da população iugoslava. Vojislav Kostunica, líder da oposição, assumiu a chefia do país. Os treze anos de Milosevic no poder foram marcados por quatro guerras, mais de 200 mil mortos, cerca de 2 milhões de refugiados e uma limpeza étnica, provocada por um nacionalismo extremado.

Cada capítulo (são treze ao todo) termina com a impressão de seu protagonista sobre o novo governo: o que melhorou, o que piorou, o que mudou, o que permanece exatamente como era.

O livro é como uma colcha de retalhos, no qual treze histórias aparentemente desconexas, ao serem colocadas lado a lado, permitem-nos conhecer um pouco mais sobre um país que cometeu, sim, erros durante a época das guerras, mas que, ainda assim, é uma nação cuja população também saiu ferida, das mais variadas formas.

Para quem gosta de livros com esse estilo, vale a pena conferir não só esse, como também "O Livreiro de Cabul", também da Åsne Seierstad.

Dica: Para quem é de Belo Horizonte, a Leitura do Minas Shopping está vendendo esse livro por R$9,90. Comprei e não me arrependo. Há outro livro dela, 101 dias em Bagdá, que sai pelo mesmo preço, e já está na lista dos próximos que vou ler.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Que diferença você faz?



De acordo com definição oferecida pela ONU, “voluntário é toda pessoa que, devido ao seu interesse pessoal, dedica parte de seu tempo, sem remuneração alguma, a diversas formas de atividades, organizadas ou não, de bem-estar social ou em outros campos.

Sou grande adepta do trabalho voluntário. Infelizmente, esse tipo de atividade ainda não é tão comum aqui no Brasil, nem tão difundida quanto poderia e deveria ser. Talvez grande parte das pessoas nem estejam interessadas, mas, ainda assim, a propaganda e o incentivo deveriam ser maiores, até mesmo para mudar algumas idéias que as pessoas tem sobre o tema.

Quando converso com as pessoas sobre esse assunto, deparo-me com dois empecilhos (desculpas?) comuns: “Ah, eu tenho muita vontade de participar, mas não tenho tempo...” e “Mas onde eu poderia fazer esse tipo de trabalho?”.

O primeiro é mais difícil de lidar, porque envolve fatores pessoais e depende do que cada um coloca para si como prioridade. O dia-a-dia é sempre corrido, os compromissos são inúmeros e os momentos de folga nos parecem cada vez mais escassos. Mas... Será que uma horinha (ou duas) por semana faria tanta diferença? Na verdade, faz sim. Faz toda a diferença passar uma hora ajudando alguém, seja ensinando algo àquela pessoa, cuidando dela, seja fazendo-a sorrir. Faz toda a diferença para aquela pessoa, e faz uma diferença ainda maior para quem ajuda. Porque, por experiência própria posso dizer, em se tratando de ajudar os outros, nós acabamos sendo os maiores beneficiados.

Bem, o que eu quero mesmo dizer é que o dia-a-dia será sempre corrido, mas, havendo vontade, nenhuma correria deveria nos impedir de fazer algo bom por alguém, colocar em prática nossos ideais. Nada deveria ser um empecilho para que nós nos doássemos um pouco.

O segundo empecilho, por sua vez, é mais facilmente solucionado, já que, nos dias de hoje, cada vez mais instituições abrem suas portas ao voluntariado.

A simples busca dos termos “trabalho voluntário” no google resulta em 658.000 resultados, aproximadamente. Dentre eles, merece menção o portal do voluntário, no qual o interessado faz o cadastro e tem acesso às “ações” que estão cadastradas, podendo, inclusive, fazer uma busca por categorias (como, por ex.: cidadania, consumo sustentável, precisa-se de voluntários, precisa-se de doações, etc.). Para quem é de São Paulo, vale a pena conferir este site.

Se, por outro lado, você não tem disponibilidade certa e não pode (ou quer) assumir um compromisso a longo prazo, é melhor evitar trabalhos voluntários que exijam tais características. Isso porque o trabalho é voluntário, mas, ainda assim, é trabalho, e não há nada pior que alguém que se disponibiliza para algo e depois desaparece, deixando na mão aqueles que contaram com ele.

Nesses casos, que tal fazer uma(s) visita(s) a instituições de caridade e/ou hospitais? Esses lugares, via de regra, aceitam receber pessoas interessadas em conversar, brincar, dar um pouco de atenção e alegria a seus pacientes. Essas visitas podem acontecer semanalmente, de quinze em quinze dias, uma vez por mês ou quando você quiser, basta avisar. É uma atividade muito bacana, porque muitas das pessoas que estão nesses lugares sinceramente acreditam que foram esquecidas pelos outros (e quantas realmente não foram?), e, quando percebem que há alguém que, mesmo sem conhecê-las, se importa com elas, é como se elas renascessem no sorriso que nos oferecem em retorno.

Recentemente descobri que é possível até mesmo ser um “voluntário online” (online volunteering), um programa (muito bem bolado) desenvolvido pela ONU. Como funciona? Após o registro, o usuário pode buscar oportunidades de trabalho voluntário de acordo com a sua preferência, podendo até mesmo criar “marcadores”, assim, sempre que uma oportunidade com aquelas características surgir, ele será avisado por e-mail.

As oportunidades se relacionam a traduções de documentos, pesquisas, auxílio no gerenciamento, enfim, coisas que você pode fazer do seu próprio computador. Na especificação de cada oportunidade, o usuário recebe informações relativas à duração daquele trabalho voluntário, à disponibilidade semanal (em horas) que lhe é requerida e ao número de voluntários que serão selecionados. Se estiver interessado, ele se candidata e responde um questionário (que contém perguntas como: qual a importância do trabalho voluntário para você e porque aquela oportunidade te interessa). Decorrido certo tempo, ele será comunicado sobre o resultado da seleção. Achei esse programa muito bom, o único contra é que o interessado tem, necessariamente, que saber inglês, espanhol ou francês, que são as línguas em que o site está disponível.

Outro exemplo de trabalho voluntário disponível é no Greenpeace. Atualmente, essa ONG possui grupos de voluntários em Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Brasília, Manaus e Belém. Para ser sincera, não estou muito familiarizada com o processo seletivo dos outros estados, mas aqui em Belo Horizonte as seleções ocorrem, via de regra, pelo menos duas vezes ao ano.

Vale esclarecer: o voluntário não é, necessariamente, o ativista! Muito do papel do volunta consiste em levar informação à população, conversando com pessoas nas ruas, em eventos... Para quem quiser saber mais do grupo de voluntas de B.H. (do qual sou parte há três anos), é só clicar aqui.

Como vocês podem ver, oportunidades não faltam e é possível encontrar uma maneira de ajudar que é perfeita para as suas habilidades e disponibilidade. Basta querer.